Hoje resolvi reproduzir nesse blog alguns casos de vioêlência sexual, editadas na REVISTA VEJA (EDITORA ABRIL), Edição 1.949, de 15 de março de 2006.
Revólta-me irreversivelmente essas historias relevantes desses abomináveis homens de todos os séculos, de todas as eras... Sempre foi assim: - A cultura carrega nas costas restos de estupros, restos de cadáveres, restos de mulheres cheias de sequelas, por alguma violação do bárbaro do seu marido, namorado, companheiro ou amigo que, infelizmente, agem por instinto como os animais selvagens.
Comento em meus textos sobre a mente distorcida dos homens do século XXI, os verdadeiros homens das cavernas de hoje. Tenho pesquisado muito sobre a mente masculina para ver se encontro algum disturbio, algo que a difere do proposto para ser normal. Normal?
Precisarei pesquisar muito e, na maioria das vezes me sinto incapaz de chegar ao topo da razão, do motivo dessa invasão de monstruosidade na cabeça masculina que, na maioria d
Já vivi o inferno de Dante, O drama de Orfeu... é o que me dá uma força sobre-humana para vencer, cortar o mal pela raiz. Mas antes tenho que achar o fio de todo esse drama, que chamamos de Paridade.
Por isso resolvi compartilhar com todos essa leitura sobre os abominaveis homens que nos circundam, que li em uma edição mais antiga da REVISTA VEJA, mas que serve para as mulheres tirarem a venda dos olhos (pois não são a estátua da JUSTIÇA) e às mãos da boca. Conversem, falem, peçam ajuda (em alguma delegacia de mulheres - a de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, Brasil -, que um nosso gentil leitor deixou postado o número no nosso blog, gritem, se for necessário.... Mas jamais fiquem em silêncio. Nós , mulheres, temos os direitos iguais aos dos homens pois temos, como ser humano, o direito de escolha, de seguirmos nosso próprio caminho, buscar nossa própria felicidade e paz de espírito.
JUSSARA SARTORI
O FIM DO SILÊNCIO

Lucila Soares
Lucila Soares
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Ingrid Saldanha
levou oito pontos no nariz e ficou com o olho roxo porque seu marido se irritou
no trânsito e bateu nela. Salma Vilaverde levou um murro no queixo porque
comprou um armário sem avisar. Sandra Farias foi espancada porque o companheiro
a viu no portão com um primo. Tammy Santiago pediu a separação
quando descobriu que o marido estava de caso com uma menina de 16 anos. Ele negou
e passou a espancá-la. Tammy apresentou queixa na delegacia e acabou dando
a senha para que sua filha adolescente tomasse coragem de revelar que o padrasto
abusava dela. Ingrid, Salma, Sandra e Tammy vivem a milhares de quilômetros
umas das outras. A primeira no Rio de Janeiro, a segunda a 70 quilômetros
de Porto Alegre, a terceira em Olinda, a última em Goiânia. Têm
profissões diferentes – atriz, produtora cultural, funcionária
pública, comerciante – e histórias de vida que poderiam jamais
se cruzar. O que as reúne nesta reportagem é a decisão de
romper o silêncio, o poderoso e cúmplice silêncio que permite
a maridos espancadores continuar aterrorizando a vida de milhões de mulheres
em todo o mundo.
Pesquisa da Organização
Mundial da Saúde divulgada no ano passado mostra que no Brasil 29% das
mulheres relatam ter sofrido violência física ou sexual pelo menos
uma vez na vida, sendo que 16% classificaram a agressão como violência
severa – ser chutada, arrastada pelo chão, ameaçada ou ferida
com qualquer tipo de arma. Apesar disso, 25% não contaram a ninguém
sobre o ocorrido e 60% não saíram de casa sequer por uma noite em
razão da violência. Menos de 10% recorreram a serviços especializados
de saúde ou segurança. A experiência internacional nessa área
indica que, em média, a mulher leva dez anos para pedir socorro. O filósofo
britânico John Stuart Mill (1806-1873) escreveu em seu célebre ensaio
A Sujeição das Mulheres que o recurso à força física
por parte dos homens era, no fim do século XIX, o único resquício
do tempo das cavernas que ainda resistia ao avanço da civilização.
É trágico constatar que no começo do século XXI a
brutalidade atávica do forte contra o fraco continue a ser tão prevalente
na relação dos casais.
Sandra Gomide, assassinada pelo ex-namorado Pimenta Neves, em 2000: ele está solto e será julgado em maio |
A história
de Ingrid estourou nos jornais na terça-feira de Carnaval, depois que seu
marido, o ator Kadu Moliterno, lhe deu um soco no carro por causa de uma discussão
sobre trânsito. Antes disso, em mais de quinze anos de casamento, nem seu
pai, o psiquiatra Ivo Saldanha, sabia do que se passava com ela. As protagonistas
das histórias publicadas aqui têm em comum também o fato de
pertencer a um grupo social que normalmente considera-se imune a esse tipo de
problema. A mulher que apanha, diz o senso comum, é sempre pobre e ignorante,
assim como seu marido ou companheiro. Não é o que mostra um cruzamento
estatístico produzido especialmente para VEJA pelo Instituto de Segurança
Pública (ISP) do Rio de Janeiro. Com base nos boletins de ocorrência
registrados nas delegacias fluminenses no ano passado, o ISP revela que 30% das
vítimas e dos agressores concluíram pelo menos o ensino médio.
A socióloga Tânia Rocha Andrade Cunha debruçou-se exatamente
sobre esse universo em sua tese de doutorado na PUC de São Paulo. Intitulado
"O preço do silêncio: violência conjugal nas classes média
e alta", o trabalho mostra que esse porcentual pode ser ainda mais subestimado
que os números gerais. A mulher de classe média até identifica
a violência mais cedo, porque tem um nível de instrução
que lhe dá acesso a conceitos como agressão psicológica,
assédio moral, chantagem. Mas, como possui recursos para recorrer à
rede privada de serviços e mais preocupação com a repercussão
de sua história no círculo profissional ou de amizades, é
mais raro que decida denunciar a agressão à polícia. "Elas
são dominadas pela vergonha e pelo medo de se expor ao meio social em que
vivem", define a pesquisadora.
O silêncio
em torno desse tipo de violência é resultado de um poderoso coquetel
cultural, que coloca a mulher em situação inferior à do homem
e, no caso da relação conjugal, mais do que isso. Na cultura patriarcal,
o marido acha que tem plenos poderes sobre a mulher. Essa situação
banaliza a violência como algo que "faz parte" da vida de qualquer casal.
Nessa categoria do "faz parte", tenta-se colocar no mesmo nível os embates
verbais mais acalorados que ocorrem em qualquer casamento e agressões físicas
que vão de safanões e puxões de cabelo a assassinatos. A
banalização da violência doméstica é o pano
de fundo que explica a maneira pela qual a sociedade lida com (ou ignora) o problema.
É o clássico "em briga de marido e mulher não se mete a colher".
Já seria complicado se fosse
só isso. Não é. A trama do relacionamento conjugal é
complexa e comporta sentimentos ambíguos. Os homens agressores não
são todos estereótipos de monstros. Ao contrário. O que torna
o problema difícil de lidar é exatamente o fato de se tratar de
seres humanos, com todos os defeitos, qualidades e contradições
que isso significa. Muitos cresceram num ambiente violento e aprenderam que esse
é o caminho para resolver conflitos. "A tolerância à violência
aumenta à medida que somos expostos a ela", diz Carlos Zuma, diretor do
NOOS, instituto carioca que faz atendimento a homens agressores. Nesse caldeirão
de contradições, Ingrid Saldanha é a primeira a admitir que
Kadu Moliterno é um pai excelente – o que não o impediu de
agredi-la várias vezes. E Salma Vilaverde passou anos acreditando que ela
era a única pessoa capaz de ajudar o marido a superar os problemas que
o levavam a bater nela. "A gente não desiste até secar a última
gota de amor", resume. A psicanalista francesa Marie-France Hirigoyen faz uma
análise extremamente feliz desse enredo. "De maneira geral, é difícil
pensar a violência, o que explica por que temos dificuldade em percebê-la.
Não queremos vê-la em nós, mesmo que a aceitação
de nossa ambivalência nos permitisse lutar melhor contra ela", diz Marie-France
no livro A Violência no Casal, recém-lançado no Brasil pela
Bertrand Brasil.
O silêncio
em torno da violência doméstica tem uma conseqüência prática
negativa sobre os esforços para enfrentá-la: impede o correto dimensionamento
do problema. Medir esse fenômeno é um desafio em todo o mundo, mas
no Brasil a precariedade estatística é um obstáculo muito,
muito longe da superação. Apenas quatro estados – Rio de Janeiro,
São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – estão razoavelmente
aparelhados, mas as tentativas de uniformização de critérios
de coleta e tratamento das informações continuam no terreno das
boas intenções. Como a estatística não é apenas
um pacote de números, e sim um instrumento de planejamento, isso significa
que o Brasil ainda engatinha também nas políticas públicas
voltadas para o atendimento à mulher.
Engatinha, mas registra avanços. Até 1985, quando foi criada em
São Paulo a primeira delegacia especializada em atendimento à mulher,
o machismo e o despreparo tornavam ainda mais penosa a decisão de recorrer
à polícia em caso de agressão. Hoje há 340 delegacias
desse tipo em todo o país, o que é pouco quando se leva em conta
que são 5.500 os municípios brasileiros, mas significa que muito
mais gente tem acesso ao serviço atualmente. A criação dessa
rede fez explodir o número de queixas. Só em São Paulo, onde
está quase um terço (175) das delegacias especializadas, foram registradas
quase 300.000 ocorrências entre janeiro e outubro do ano passado. Investiu-se
também em treinamento e na criação de uma rede de apoio que
torne a queixa policial apenas uma parte do enfrentamento do problema, e não
um fim em si. Em muitos casos, a mulher agredida precisa de acompanhamento psicológico
e jurídico, ou de apoio para se qualificar profissionalmente e ter condições
financeiras de se separar do marido. Em outros, necessita concretamente de proteção.
Já existem, embora ainda em número claramente insuficiente, centros
de referência (48) e abrigos (81) para atender a esse tipo de situação.
A demanda é enorme. No Rio de Janeiro, o Centro Integrado de Atendimento
à Mulher (Ciam) faz mensalmente 800 atendimentos entre acompanhamento e
casos novos (que somam cerca de 180 por mês). "A demanda da mulher em situação
de violência vai além da esfera criminal. Muitas vezes ela não
quer dar queixa. Não quer boletim de ocorrência. É um direito
dela. E para isso é muito importante ter uma rede jurídica, policial,
psicológica", diz Lenira Silveira, diretora da Casa Eliane de Grammont,
centro de referência que funciona na capital paulista.
Onde ainda falta avançar, e muito, é no entendimento de uma obviedade:
violência contra a mulher é crime. A lei diz isso. Mas, socialmente,
só quando a agressão resulta em lesão muito grave ou em morte
da vítima ela adquire o status de crime. Ainda assim, sujeito a questionamentos
sobre algum motivo que possa justificar a atitude do agressor, como traição
ou desespero pelo fim da relação. Essa teria sido, por exemplo,
a motivação do jornalista Antônio Pimenta Neves, que aguarda
em liberdade o julgamento por haver matado a tiros, em 2000, sua ex-namorada Sandra
Gomide. A professora universitária Núbia Conte Haick registrou dezenas
de boletins de ocorrência dando conta de agressões pelo marido e
acabou assassinada por ele porque decidiu se separar. A legislação
brasileira melhorou consideravelmente nessa área, embora com bastante atraso.
Só em 1988 a igualdade entre homem e mulher no âmbito doméstico
foi consagrada na Constituição. E até 2005 vigorava um pré-histórico
inciso no Código Penal que extinguia a punibilidade de um estuprador se
ele se casasse com a vítima ou se ela se casasse com qualquer outra pessoa.
Ainda persistem excrescências.
A principal é a inclusão dos crimes domésticos no âmbito
da Lei no 9099, que se refere aos crimes chamados "de menor potencial ofensivo".
Essa lei foi criada com o objetivo de agilizar a solução de conflitos
por juizados especiais, incentivando o acordo entre as partes. É um mecanismo
bem-vindo para desafogar o congestionadíssimo Judiciário brasileiro.
Funciona muito bem para brigas que comportam compensações financeiras.
Mas não para os casos que envolvem a complexa teia de violência que
se instala na relação conjugal. Nessas situações,
em que a mulher teve de reunir todas as forças para fazer a denúncia
e freqüentemente está sendo ameaçada pelo agressor, propor
acordo é praticamente coagi-la a recuar. E prever o pagamento de cestas
básicas como pena para o agressor aproxima-se do escárnio. "A sensação
que existe em relação a esses crimes é de total impunidade",
diz Jacira Melo, diretora do Instituto Patrícia Galvão, de São
Paulo, ONG que desenvolve projetos sobre direitos da mulher.
Que o diga a professora carioca Vânia Crespo, 47 anos, autora do livro Assédio
Moral, em que reúne três histórias de violência doméstica
construídas com base em sua experiência e nos casos que levantou
com outras mulheres. Vânia mergulhou no inferno há quatro anos, quando
foi viver com seu companheiro. No começo, eram apenas cenas de ciúme.
Em seguida, a situação começou a se agravar, mas, como as
brigas se alternavam com pedidos de perdão, flores e promessas de que a
história não se repetiria, ela cedeu. A agressão física
não tardou e, com ela, vieram a vergonha e o medo de que vizinhos e, principalmente,
as filhas escutassem qualquer coisa. "Tornei-me tão submissa que, quando
abri os olhos, não sabia mais quem era", resume. Ela acabou tomando coragem,
deu queixa na delegacia da mulher, mas, apesar de estar sendo ameaçada,
não conseguiu que fosse tomada nenhuma decisão destinada a protegê-la
porque não existe o mecanismo legal de prevenção.
Estava prevista para a semana passada a votação de um projeto de
lei destinado a corrigir essa distorção. Acabou atropelado por medidas
provisórias e espremido entre as sessões destinadas a discutir a
cassação de parlamentares, mas deve voltar à pauta nas próximas
semanas. O projeto foi redigido com base em discussões feitas em todo o
Brasil com entidades femininas e traz como principal mudança a criação
de juizados especiais de violência contra a mulher, a exemplo dos que existem
para crianças, adolescentes e idosos. Entre outras medidas, o projeto elimina
o pagamento de cestas básicas e admite como pena alternativa apenas a freqüência
a serviços de reabilitação pelo agressor e estabelece mecanismos
de proteção à vítima. A lei tem também um sentido
educativo, como define a advogada Leila Linhares Barsted, diretora da Cepia, ONG
que se dedica à formulação de políticas públicas
voltadas para as mulheres. O fato de a violência contra a mulher ocorrer
dentro de um quadro cultural bem delimitado, que a torna "natural" aos olhos da
sociedade, não a torna justificável. Já foi "natural" considerar
os negros uma raça inferior. Hoje o racismo é crime inafiançável.
Suas manifestações cotidianas existem e volta e meia criam polêmica
– como a que envolveu o jogador Grafite, do São Paulo, e o argentino
Leandro Desábato, do Quilmes, no ano passado. Muita gente achou ridícula
a detenção de Desábato "só porque" chamou Grafite
de "negro de mierda". Não importa. Agora, no Brasil, todo mundo sabe que
racismo é crime e pode dar cadeia. E isso faz toda a diferença.
Para os homens espancadores de mulheres, punições severas também
fariam a diferença.
UM TRAMA SUBTERRÂNEO
Estudos sobre violência doméstica mostram
a ponta de um iceberg. Pesquisa da Organização Mundial de Saúde
divulgada no ano passado revela que, no Brasil, 22% das mulheres que foram agredidas
pelo marido, companheiro ou namorado (ou seus ex) não contaram a ninguém.
Ainda assim, o quadro é impressionante
•
De acordo com a OMS, 29% das brasileiras relataram ter sofrido violência
física ou sexual pelo menos uma vez
•
16% classificaram a agressão como violência severa (ser chutada,
arrastada pelo chão, ameaçada ou ferida com qualquer tipo de arma)
• 60% não abandonaram
o lar sequer por uma noite por causa da violência. E 20% saíram
de casa uma vez – depois voltaram
•
No Rio de Janeiro, pesquisa do Instituto de Segurança Pública mostra
47 770 casos de lesão corporal dolosa contra mulheres registrados
no ano passado. Em 87,3% das vezes, a vítima conhecia o agressor, e
53,5% dos agressores eram casados ou mantinham algum envolvimento amoroso
com a vítima
• A mesma pesquisa
mostra que 30% de vítimas e agressores concluíram pelo menos
o ensino médio
• Segundo a
Anistia Internacional, na União Européia morrem 600 mulheres
por ano vítimas de violência doméstica
• Na França, de acordo com o mesmo relatório,
67% dos homens que agridem suas mulheres têm o curso superior completo.
Postado por JUSSARA SARTORI
Poeta, Escritora & Freelancer
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